Muito tem se falado de acolhimento a pessoas LGBT+ no âmbito da Igreja Católica. Ao longo dos anos surgiram grupos de apoio, pastorais e outras tentativas de inclusão dessas pessoas no contexto eclesial. Contudo, ainda é comum ouvir relatos de sentimentos de exclusão e não pertencimento.
A atuação de pessoas LGBT+ dentro das igrejas, quando existe, em sua maioria ainda se dá de forma escondida e camuflada, colocando essas pessoas à margem e fazendo com que muitas fiquem pelo caminho.
No Evangelho segundo Lucas, capítulo 15, versículos de 4 a 6, Jesus ensina seus discípulos por meio da parábola das cem ovelhas. Nessa parábola, um pastor deixa as noventa e nove ovelhas em segurança, para procurar a única ovelha que se perdeu. Neste mês da Bíblia, proponho uma releitura e nova interpretação dessa parábola sob a ótica do cuidado com a comunidade LTBT+ pela Igreja.
Vendo nas pessoas LGBT+ a figura da ovelha desgarrada do rebanho, incito à reflexão do porquê essas pessoas estão ficando pelo caminho. Estão fugindo? De quem? Por quê? Estão se perdendo ou estariam sendo deixadas deliberadamente para trás, sendo esquecidas?
O Evangelho destaca o valor inestimável de cada ser humano para Deus, que entregou seu Filho único como o pastor que deu sua vida pela humanidade. Cada pessoa é única e insubstituível, independentemente de sua identidade de gênero ou orientação sexual. Em Jesus, as comunidades de fé são chamadas a cuidar de todos os seus membros e membras, incluindo quem muitas vezes se sente perdido ou é marginalizado.
Uma interpretação inclusiva da parábola das cem ovelhas ensina importantes lições que servem para construir pontes e materializar a sinodalidade promovida pelo Papa Francisco, dentre as quais destaco algumas para reflexão:
Valorização da Individualidade
Cada pessoa tem um valor inestimável. Ninguém é substituível. Assim como o pastor valoriza cada ovelha individualmente, dando especial importância àquela que se perde do rebanho, as comunidades de fé são chamadas a valorizar cada pessoa LGBT+ como uma criação única e amada por Deus, uma parte fundamental da igreja e merece ser aceita, cuidada e apoiada. “Na Igreja, ninguém é supérfluo. Ninguém é supérfluo. Há espaço para todos. Assim como nós somos. Todos nós.”.
Inclusão e Aceitação
Na parábola, a ovelha desgarrada não é abandonada; em vez disso, o pastor vai ao seu encontro para trazê-la de volta. Da mesma forma, a Igreja deve trabalhar ativamente para resgatar aqueles e aquelas que ficaram pelo caminho, aceitar e incluir pessoas LGBT+ no trabalho pastoral e oferecer um lugar seguro de amor e compreensão. “Somos todos chamados pelo Senhor, chamados porque amados”.
Cuidado e Orientação:
O cuidado demonstrado pelo pastor vai além de simplesmente encontrar a ovelha perdida: ele a protege, a cura e a reintegra ao rebanho. As comunidades de fé devem seguir o exemplo de seu Pastor e oferecer cuidado compassivo, orientação espiritual e apoio emocional às pessoas LGBT+. Ao demonstrar amor incondicional e compaixão, a igreja ajuda a reintegrar aquelas e aqueles que se sentem abandonados devido à sua orientação sexual ou identidade de gênero.
Desafiar Estigmas e Preconceitos
Optando pela inclusão e cuidado, a Igreja deve desafiar os estigmas e preconceitos enraizados na sociedade e nas comunidades em relação às pessoas LGBT+. Isso envolve promover diálogos e reflexões e educar seu rebanho sobre questões de diversidade, promovendo o entendimento e fomentando a empatia. Quando crenças limitantes e prejudiciais são desafiadas, as comunidades constroem pontes de compreensão e aceitação.
A Igreja precisa se tornar espaço seguro e acolhedor, que transborde o amor ensinado por Jesus, cumprindo seu papel de pastorear emocional e espiritualmente todas as pessoas. A liderança religiosa precisa se voltar para as Sagradas Escrituras, com o olhar de Jesus, saindo de suas convicções pessoais, para internalizar os ensinamentos de amor e cuidado.
A jornada rumo à aceitação plena é uma responsabilidade coletiva, e cada passo dado aproxima-nos da realização do ideal cristão. Nessa jornada encontramos o verdadeiro significado de ser cristão: amar uns aos outros como Deus nos amou. Um amor que transcende barreiras, constrói pontes e une a todas e todos como filhos e filhas do Deus que é Amor.
Para que uma mudança concreta e efetiva aconteça, é imprescindível que líderes religiosos promovam a aceitação e o amor ao próximo em suas comunidades, independentemente da orientação sexual ou identidade de gênero de seus fiéis, e colaborem com organizações para oferecer serviços sociais, aconselhamento e apoio emocional a pessoas LGBT+, demonstrando o compromisso da Igreja com a inclusão e o cuidado.
Pamella Barbosa Silva
Mestre em Leitura e Ensino da Bíblia
Diversidade Cristã Brasília
Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT+